terça-feira, novembro 16, 2010

Literatura, Hoje

o grupo de pesquisa escritura: linguagem e pensamento convida para:
encontro de escritores na UnB
diálogos entre Luiz Ruffato, José Eduardo Agualusa, Maria Esther Maciel, Claudio Daniel e Ronaldo Correia de Brito.
Dia 09 de dezembro, das 09h às 12h - no campus da Universidade de Brasília.

sexta-feira, novembro 12, 2010

útlimos artigos

caros,

disponibilizo dois artigos, que podem ser de interesse:

"Da herança do outro na narrativa homérica"
http://www.letras.ufmg.br/poslit/08_publicacoes_pgs/Aletria%2020/09-Piero-Eyben.pdf

"Bétulas e sombras: o problema do ícone na poesia e no cinema"
http://www.revistacerrados.com.br/index.php/revistacerrados/article/view/162

até, abraços,
Piero

quarta-feira, outubro 20, 2010

διθύραμβος

sehr auf Nietzsche zu schließen



abeto: eleges a cauda e freme,
em límpida tez – aurora. à seta,
cresce – pária e pafos, exortando –
o fogo e o véu da vigília: voz, ouvida
e calada, ao som uno, de só uma presa.

sulco: leve pesar de fera mi priegha,
de voo e lenta nuvem. carmim, o pêssego
da água, de longa jornada e campo –
estriando-se do cristal, pilhado –
luz e cimo caem ao respiro, extremo.

videira: irrompe a queda, lançada de
flor, pela palavra que funda; ordem
despida, dentro e para si. o ar nunca
deixado, vítrio-gris aloja-se sob o báculo
núncio da sílaba – dia pardo, flama.

sede: à boca, o caule dado aos pés de
casco – bode e músculos – só lábios
brotando à festa. porta-fogos, cada
qual à casa, ritmo e tela, a donzela
decai sobre o bosque; tumba-grota.

mar: espessa palavra, forma e ribeira,
imprecisas um só flanco, levado à mão,
contra tez, compassada, a fronte.
murcho coral de sal – armas à cidade –
massa galátea, pressa e tempo: letra. 
                         

terça-feira, outubro 12, 2010

fantasmagoria e língua

tout auprès de Sade
  

de onde, em minha língua tardia,
estive às vésperas? um só fundo
religa obscuro beiral, lânguidos –
e livre, o sutil acordo de querer-se

pedra e parte, faca e sêmen – às
vísceras legíveis, encalacradas,
de outra figura, de pálida, a turba
fixa e afunda, um só passo: disfarce.
 
erro convulso e pulso, noites preclaras
são poços, estrelas lançadas em letra
e véu, em um e outro limítrofe úmido:
esquálido, o chão retumba – voz, rouco.
  
torres ainda eco: sus-supra, um só
castiço – à garça deixada, a flor o baço.
convulsa lenta e ainda arquia – move-se
de linho em linha, o sangue a frio.
  
silente, o limiar corrói lã e lama,
a presença retraça um livro – de
pressa – fulcral e falida inscrição
de mais pedra.
      

quinta-feira, setembro 16, 2010

cama, de palavras

mélica para fabricia, em sono.

frente às tuas mãos, folhas e horas,
o castanho de um dito, em ar e pêlo,
calando murmúrios – transporte e
metal – o nome, teu, aparece em fio
e fim de um só mar, mantendo a
promessa – o juro de errância.
tarde é o pássaro, sus e já outono,
em pó e tudo aroma: pétala de
cinamomo; grão repouso da can-
ela; à vontade teus pés, agora, já
dançam, enquanto sonhas –
antes, a noite, lanças-te à distância
próxima e breve, lume e cor – e
selas então – a mais álacre – um
só dente, ressoando passos.
             

sexta-feira, setembro 10, 2010

à parte do ocaso

para o andré, se recuperando


ὥστε θνητὸν ὄντα κείνην τὴν τελευταίαν ἰδεῖν
ἡμέραν ἐπισκοποῦντα μηδέν᾽ ὀλβίζειν, πρὶν ἂν
τέρμα τοῦ βίου περάσῃ μηδὲν ἀλγεινὸν παθών.
coro (édipo rei)

[atento ao dia final, homem nenhum
afirme: eu sou feliz!, até transpor
– sem nunca ter sofrido – o umbral da morte.]


podes, entre um sempre e amoras,
mitigar fantasmas –
à margem da estrela, jaune
de doce ar, entre muros.

à queda, um caminho e promessas:
novo o ocaso, consolo –
em um vazio, nomes. escuto,
ilhado, o brilho que há.

vestígios, entre pé e perna;
mais à esquerda do dia e da
verde vinha lançada, a partir.
fronte à frente, os risos de lá.

todo lugar é para além, de
si, no mesmo ermo: de édipo,
ao canto exódico premente,
repete-se na calma, do acaso.

            

quarta-feira, julho 07, 2010

rembrandtiana: de nachtwacht

   


palmas e lampejo – de escuro e
escara, a dor de nunca – entre
forja e fosco, rosto a nuca: vês,
ainda há dor – o cão ladra, voo –
mais abaixo, zune o anão, em
elmo e máscara, escarro – é
manhã, guardada, de um só,
portando as armas.

ponta a ponta, um rio desce de
cor-negrume, o rumo cisco de
veste e presente – um dom –
deixado ao som, tumba e tambor,
nas hordas da tinta: todo um ân-
gulo convertido, centro e manhã,
véspera, de um só, que mira teus
olhos, tumulto de flâmula, fixamente.

aguardas, no entanto, o lume
atingido e temes a palavra,
tátil do eco do sino – anunciando –
que, antecipa, a supra estrela,
ημέρας ao encontro de traços –
teu silêncio – nas asas submersas
no obscuro de alvor-amarelo:
os rostos, cada um, lanternas.
           

domingo, julho 04, 2010

αντιγράφω

             
à voz, deito-te esperando
o contrário, vexa:
abrigo e tez – entre cor
e pomos, refutados.

a mor e fuste do dizer,
vir às metades – entornas –
de um só riso, luz
que morre, um cálice

a mais. absortos, os
óleos esboçam lamento
e cama: habitar essa casa,
entre fogo e imersão:

ar – escreves a medida –
ergue o peito e prepara-o
ao desterro a mim, contra-
rio – um só fio envolto.

minha voz, à direita,
retém o deserto sobre
ti. canso, à amanhã das
encostas: álacre sufoco.
     

sexta-feira, junho 18, 2010

nênia para josé saramago

                                       

ensaias a ti, forma de vácuo
e cegueira, assim.
à pena e pele, da ilha exília.
no tempo, em que te apagas,
o nome se borra e molda
texto e miragem, mucos
do dentro, das formas:
ainda a flor, mais antiga.

serras, ainda, a palavra,
o diálogo, em fluente
mácula e miasma do
dito-costume: morte
que aguarda, sempre,
os focos do desprezo e
à viagem, por tudo, des-
feita. a tudo um não, ético.

mas, agora, cala-te em
calcar de dedos: a escrita,
moldando-se, um senão
de contrários, o vão de arestas.
         

segunda-feira, junho 14, 2010

uma mística. lírica sob lírica

                                                                                                                                           a fabricia

ar e gelo, perfume de hera:
ripas e malhas, o silêncio
percalço e permanente –
sim, de fuligem e ar.

chama ao mar, música de frios:
o que és de brisa, freme
a única nota repetida, a
criança trazida e aziaga, chama.

água e nada, absorvendo,
nada compete aos rododendros:
menos ainda, a escritura de
tuas mãos, lançadas à água.

terra, como se seca, de vã
alvura: apercebeste a manhã
noturna – apenas um só
dos caules, devaneio, e terra.

dia, ânimo de túmulos, cumula
de palavra a pérola do dia.
suspira o peito – piedoso, cor
de mor – manchado, suspiro.
     

segunda-feira, junho 07, 2010

nênia para kazuo ohno


silente agora o corpo:
entre pó e branco.
preclara manhã –
as mãos de espírito,
molde, impenetrado,
o ar não se contém.

figura – limítrofe –
faz de foz, a face re-
talhada: em deces-
so, transpassa morada
e espera desse músculo:
afônico de grafos.

o nihil de palco, à
veste bordejada,
converte-te agora:
silêncio e recife, em
buta, teu logro, soalho
de vinhas – acordas, e
mar.
         

quinta-feira, junho 03, 2010

inquisição/départ



toma o secto, o seio seco,
esse anti-ofício do momento,
para si, apenas.


clausura e pensado – alta
fantasia – em nus e fossas,
um só respiro.


deixado, o querer parte –
lança – hier raus, às
nódoas, foscas.


pescadores, mente, ainda,
torturam, suspendem
a pena: um só silente.


afasta do colo, após.
          

terça-feira, junho 01, 2010

nênia para wilson bueno

"os rememorantes possuem ainda outra qualidade essencial ao seu ofício - alcançam perscrutar, mesmo no sono mais embrutecido, os sonhos que ali morrem e se movimentem com esta graça inquieta que costuma ser, dos sonhos, o seu maior triunfo." (wilson bueno)



desarolla o caminho, entre
punho e pulso: ainda rastro.
contaminas o cardo, em
possíveis matérias – esse mar –

da graça – zoo de signo – gárcea.

verto, no passado, o nascer,
entre dado e molde: salir em
la calle – mouriscas – o que
de si dispersa. há carne e sangre;

em lapso e lança, sub-limo.

exploras, no entanto, o abismo:
quimeras e equidnas:
reflexo e amplexo – si a sim –
de distância e, não sendo, sombra;

notas, assim, o estranho pétreo.

voz que flutua, enquanto –
a cera cava
o mó, a lesma – formando
a estela – ao fundo,
exato lazúli: zôon
logon (ouk)
ekhon.
       

segunda-feira, maio 31, 2010

quinta-feira, maio 13, 2010

para hilda, por ontem

     
plena a fala, apenas.
dura pena de sentir-se,
alvejado.

assim, o suspiro de
teu hálito - tudo o que é
ainda, sendo mãe -

dragando o obscuro,
nó e contra nó, lanço-me:
concede-me agora,


mais além do ninho,
o poder estar, não estando,
para fora, no já era.

apenas uma forma do
cínico poder, já por ti
devastado; em denúncia.

nada espero, à beira
da imagem - ainda há meta,
para fora, para além

sendo este, sem o olho,
o sentido que ainda me
impele, continuar, pertencer.

permaneço, ao lado,
força e tempo, pétala:
à luz doada, apenas

um arabesco. enquanto,
de pedra, a escrita se
perfaz - não mais aguardo

ascender, apenas aceso,
o outro agora já me é
claro. e tu, intacta, feroz:
VOCIFERA.
        

danos e divisas; cerrado

atravessa o dia, enquanto insistes,
à beira da sombra, dos ditos e
olhares – jugos e mulas – in-contestes;
assim, o fim de tal e tela: estanques.

buscam, zunindo em poças, o não
de ouvir apenas cisnes, de forma:
carcaça deixada, contra tudo o que
almeja ser, do dado um nada.

ouso farpas, mesmo quando o
do tempo concede-me um só lado –
de fossas e cinismos: e tudo é como
se. grandes sorrisos alegres, consolo.

arpejos escritos, ainda uma via
melancólica, amara. toda uma gente,
a julgar e mentir, como se outras,
acima do voo e da ave: infecundo

telegrama, teleférico, télos.

ainda o resto é possível?
plena fala, em que o lugar, de sem,
colhe o mar de um só haver,
apenas reino falso, fama e folhas,
tremulando, térmitas.
  

terça-feira, maio 11, 2010

para o aniversário, um acróstico

para fabricia

foz, ruído surdo, aos pássaros inertes
ainda da manhã, enquanto dormes,
bulício fosco, morno, calmo – rasgando –
rompe o silêncio de um só dia, esse
início: rastro-palavra, deixada, aflita.
carcomem tez e mais dias, mas permanece,
intacta de sonos, reclinada, tu, morada,
andas em um só peito, vestígio mudo.


névoas, graça e véu, de fios
ouvidos: marfim da pena, sob pluma,
voz, tenso-repouso, o sob
olfato, hulhas e fim:


agora, como que de flores,
núncios, o tempo as embaça
no espelho, só olho que retorna,
outro de mar, à lua dada.


dizes, em vinho e tempo,
ontem, o saber de pedra,
mesmo arabesco, os lábios,
inócuos de ar, molho de rumor,
nada, do que advém ao sopro,
ilharga rubra, o sempre está, de hoje.
   

segunda-feira, abril 26, 2010

rumor

convulso, refaço toda
marca – escrita-jazigo –
em um só corpo, nó. as-
sim, vitimas o fogo,
orientando-se, olvido.
bordas e renegas: falaz,
olho e aurora – sob –
inundam de adeus; outro-
ra. estanco, estás
convulsa, de palavras.
     

de mandelstam, indireto


o som, cauteloso subjugo,
da fruta ter se descolado
da árvore entre inquieto sussurro
do profundo silêncio do bosque.


óssip manldestam
(repoetizado)
 

céu aberto


de blau vergo o chão,
trocando o sol, pela
manhã: abetos e nenúf(
sonho-despedida)
ares.

de mim, autocômodo,
moribundo desse outro,
o corpo espaça a culpa
sil(vestida)vestre;
ardor.

o ventre preclaro, a-
inda uma torre, in-
finda: dedos mol(
peso)
dados, arfantes.

espéculo do cima,
precipício do rosto,
abaixo dessas raízes –
mudança de tem(
pulverizado)
pó.

enquanto ajo,
escri(p)ta nítido-
voraz. ás. extensas
mãos e vermelho:
apanhar ícaros;

a recusa, língua
de mil dentes,
escusa-se de si: a
mais dentro, mais
fronteiro.

ares, órgão real,
além, blau e moras.
evado-me calando o
sor(rumorejo)
riso, de mim:

abaixo, são degraus,
bosque e fosco, conluio
de lapsos sus(piras)
penso
alicerce.

do caminho, o dito,
freme estranho
mal(feitor)
fadado, disso que
só sobra, der-
rota.
       

sexta-feira, abril 23, 2010

torre de montaigne

morada e manso passo,
traz-se a si, o ele da escrita,
essa mácula abaixo do
acabado: eu.

move-se, no entanto,
por nome a nunca –
formas e chão, à nuca
de torre e pedra.

monstro de si, saber
é essa demanda:
loucura e jardim,
apagar-se.

monte e anhos,
sacrificas do alto
selvagem da
tortura, do embaraço.
        

quinta-feira, abril 22, 2010

brasília





pálpebras, besta cerrada,
cerceando o gris e o alvo –
morada de estanques ad-
vinhas esfumadas – o corpo,


desnudo do traço, acima
abaixo – jornada oblíqua –
de ti, um só vento, ladrilhos:
espalmada, plena em silente.


reluz, do olhar espuma, o
calhau da noite – o audível
de hora a mora – todas as
vigas suspensas, como se


leves: língua de faca, fagulha
fincada de voz, ninguém. a
estrela oca, sob as mãos, de
flor atravessada – isolando


o junco – por palavra e cal.
cimentas a chuva, abrigo
de esboços, tudo em torno,
lágrima e lástima: ar apagado.


verso seco, de ipê e horizonte,
hiância do dizer, remido, de
imersos e preclaros vazios:
a curva, no plano, morada
anfidestra.
  

quarta-feira, abril 14, 2010

rublev, para olímpia



  




tempo ancorado em ouro,
ainda o caule d’água, faz-
se pó e selo: o risco quase
rasura –


noturnos olhos, finos,
sombra e plainos, a
linguagem – marolas
e pérolas.

ascese – dês nascido –
de corpo e pêlos, um
jardim de homens,
entre asas e ex-

cicios: toda água
tomada de jokhann,
de uma dimensão,
acima, manto.


dissolvendo-se, em ocre,
as vestes da carne
remontam o sangue,
em ser –


macio farfalhar, por
onde andas, e na
calma de um dia,
sorri à fantasia –

o todo sangue der-
ramado, recolhido.
    

domingo, março 28, 2010

engendro: prometeu arabesco

      
τίς ἀχώ, τίς ὀδμὰ προσέπτα μ᾽ ἀφεγγής;

[que eco, que cheiro voa até mim, sombrio?]
(prometeu, via ésquilo)

asa e véu, o perfume escalando,
converte-te ao solo em tímpano –
de si o som de céu, conversa e
folha, deixada ainda, sob a cava
vaga de esporas, amanhecendo
como louça lúgubre, em leito –
ao soluço, retornam as palavras,
acolher crueldade.

uma só língua, entre arabesco
e cetim, o luto, o avesso – calando
a noz, o dentro-fronteira, tampon-
ando-se à queda, doce adeus –
em flor, de nada, esquecida:
a nau da demanda, esse corpo,
esse único de cicatriz, uma só vez,
de não-apenas, aqui.


à morada da boca, ardem fraga e
limo – relembras o tecido, de
olhos –; estranho e mudo, de foz
e força, pedra cega: grilhão e
abismos todos. mordem-te ululos,
tez e fogo, metal partido; fundição.
a voz, frágua de pele, aguarda,
suave.
                 

sexta-feira, março 26, 2010

Geheimschrift


da cera, passada, os rastros
habitam – fronte e morada –
esse corpo, delgado, de
folha a lâmina, estilo e gris.

assim, cal-
cada traço, desmente-se,
filame secreto, decifrado:
a escrita em si, refunda-se.

prodígio, os sulcos guardados,
um sesto ao inverso – re-
filtram as manchas, espargindo
mais sopros, anima.


ainda permanente, todo signo
perfaz-se ao baldio, nó de
estrada e via retalhada: sonho
fraco, alusão de morsas.

anamnese e atraso – imago
retraçada, sustida pelo lápis –
no envio da voz, calada de
letra, na asa da origem,

sempre re-
nascida em tempo-
arada, wenn er nachdenkt,
o só pedido, convertido

de mãe,
naquilo que a escrit-
urra da página, no livro, um
bloco de ar, celulose e ártemis –
cantando-se silentes, recifes
e pele – enquanto correm,
cortando-se quando, o reflexo
outro, de tropos.
                         

quarta-feira, março 24, 2010

alguns alhures na (in)tradução

   

une voix venue d'ailleurs (maurice blanchot)

uma voz vinda de alhures

uma voz vinda de longe

uma voz vinda aliás

uma via vinda de alhures

uma via vê nua aliás

uma voz vésper de alhures

uma vez vinda de todos eles

§ § §

aliás, uma voz, de alhures, vinda:
visão vesperal, toda a vênus, deixada.
nua, a forma, a via, de uma voz -
deles todos, de outro lugar, futuro.
             

mákhe: nome e o hágios

  
de toda marca, obscura
nódoa de brancos, a fonte
despe-se e conduz-te em
seixo e calhaus, de vereda
e vislumbre: mós, ao corpo;
pele aos pés, o pó do nome.
                                     

sábado, março 20, 2010

velas, tu

   
à margem da vela deixada,
a fazedora permanece, em si,
estanque rota. simplesmente.
o tempo, ausência de imagem,
coroa o pavio, a cera -
contradiz o lume, em
sombra-de-palavra -
em pingos e sangue derramado;
corpo, esse intruso, con-
dizendo-se ver, para fora, cirro,
o derrame, desvelo:
espaço escondido, nos
braços, carcomidos de
mudez.
                                              

máscara, de nietzsche

Wir haben die Kunst, damit wir nicht an der Wahrheit zugrunde gehen
[nós temos a arte, com isso não nos afunda a verdade]
Friedrich Nietzsche


esporas, deixando-se –
as formas de um som,
silente, de bodes –
macerada a marca,
insana, foz, de ti
rãs e bois, levados.

sólido pêlo, estanque
o ar, respiro último
de verdade e veemência –
o corpo roto, maculado
de gris, cavalo deitado,
raso olho, laceração –

e vontade, querência:
ramas e tecidos, enquanto
não definhas; o mais
querer – desse traço,
alvo-desnudado. falange,
sentença preclara, cal.

à fêmea, de olhar-te,
lê-se um só modo, ex-
perecimento, todo o
fruto – tâmaras – do dizer,
letra e cursos, mais-além,
soluço de vinho

e dança de tristan, ambos
calados, de outro
espaço e voz, alhures,
arrulho de água. sal de
olhos e óleo de santos;
convulsiva, acima,

a moral daquilo, de dizer.
espéculo – bayreuth lan-
çada, aos pés – e espólios.
a si, o tempo. tudo,
fome repentina e serpe
desdita o outro lado,
de nada.

quarta-feira, março 17, 2010

sobrescrita, voluta


falas, para longe de mim,
enquanto a mão, demora
interna, falseia o chão de
gris.

falas, em termo de asas,
vestindo-te agora, calada,
de nu e sombra, em palavra,
grão.

falas, aos gomos, épura,
tecendo sons, dormem os
olhos, de carnes e chifres,
grei.

falas, tomada de sol, claro,
das pernas, repouso, galhos,
e culpa de vento, o tempo,
grous.

falas, calma de ti, retida,
e ouves a descida lenta,
fio a fio de dia: sentencias,
gruindo.

terça-feira, março 16, 2010

a lume spento

or le bagna la pioggia e move il vento
di fuor dal regno, quasi lungo 'l verde,
dov' e' le trasmutò a lume spento.
*
[e o banha a chuva e o demove o vento
para além do reino, cercando as margens
do verde, onde o transladou a lume extinto.]

dante alighieri, purg. iii, vv. 130-133


coberta a cabeça, pré-
claras manhãs, o
medo, o sentido
se escorre,
calando-se, na
fala –
faunos e gárgulas,
monturo de moradas.
o dizer revê aquilo,
que em ti vive, má-
cula da palavra,
a voz repreendida, no
óbito, do
olvido:
órbitas daquilo
que se separa, tronco
e pescoço, vindo
ao pó de vestes,
paras. chiado –
ausência do manto –
mantém-se descendo
o calor do mais verbo,
a mor, pó dor. tudo,
enquanto decalcas
a sombra, o medo,
o nada. minguando-
se os fios, temendo.
a boca e o pincel,
o dedo nas mais
cordas – tão –
soluçando, ao
caminho, mais
tenso: espectro,
e aguardas. dei-
xando-me mais
a mais de tuas
rosas – só lustro –
spento – o corpo,
esfumaças da ponte,
rebentas, colhido.

ultimar a falar, traduzindo celan


Sprich auch du,
fala também tu,

sprich als letzter,
fala o extremo,

sag deinen Spruch.
diz tua sentença.

  
Sprich –
fala –

Doch scheide das Nein nicht vom Ja.
porém não corte o não do sim.

Gib deinem Spruch auch den Sinn:
dê a tua sentença também o senso:
gib ihm den Schatten.
dando-a à sombra.

Gib ihm Schatten genug,

dando-a sombra plena,
gib ihm so viel,

dando-a ao muito,
als du um dich verteilt weißt zwischen

quanto a ti tu sabes espalhá-la entre
Mittnacht und Mittag und Mittnacht.
meia-noite e meio-dia e meia-noite.

Blicke umher:

olhe ao redor:
sieh, wie's lebendig wird rings –

veja, como ao isso vivo tornam-se anéis –
Beim Tode! Lebendig!

em morte! vivo!
Wahr spricht, wer Schatten spricht.
verdade fala, quem sombra fala.
Nun aber schrumpft der Ort, wo du stehst:

contudo agora míngua o lugar, onde tu estavas:
Wohin jetzt, Schattenentblößter, wohin?

para onde agora, o dessombrado, para onde?
Steige. Taste empor.
escala. tateando empós.
Dünner wirst du, unkenntlicher, feiner!

escasso tu te tornaste, indecifrável, estreito!
Feiner: ein Faden,

estreito: um fio,

an dem er herabwill, der Stern:

à ela desejo-desce, a estrela:
um unten zu schwimmen, unten,

para abaixo flutuar, abaixo,
wo er sich schimmern
ali ela retém o cintilar
sieht: in der Dünung

de si: no vagaroso da onda
wandernder Worte.
sempre viandante de palavras.



paul celan
piero eyben